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Entrevista com Klaus Regling publicado em Jornal de Negócios

ESM
Entrevista com Klaus Regling, director executivo do ESM
Publicado em Jornal de Negócios
4 de abril de 2019
Entrevistadora: Margarida Peixoto
Língua original: inglês
 
 
A economia portuguesa vai na direção certa?
 
Todos os países, em todos os momentos, têm algum trabalho para fazer. É como ter uma casa: há sempre alguma coisa que não está bem – no mínimo temos de arranjar o jardim quando chega a primavera. É por isso que todos os Estados-membros da UE recebem todos os anos da Comissão Europeia recomendações sobre como remover obstáculos ao crescimento. Portugal teve um desenvolvimento muito positivo. Houve muitos ajustamentos, e duros, durante a crise e no contexto do programa de ajustamento. Alguns dos resultados vêm daí. Mas há questões que permanecem e o Governo está bem a par disso. O rácio da dívida continua elevado, um dos mais elevados da Zona Euro. Está a cair há já três anos, cerca de dez pontos percentuais. Mas tem de continuar, não está terminado. O malparado desceu e isso é bom, mas continua a ser o terceiro mais elevado na Zona Euro. Também no capítulo orçamental, devia olhar-se para as despesas. E para o sistema judicial talvez também se devesse olhar.

Poderia ter havido um esforço maior, com mais progresso?
 
Não, até ao momento o progresso é bastante bom, mas não significa que esteja terminado.

A dívida pública é bastante elevada. Ainda é relevante?
 
Na Europa é inteligente ter o nível de dívida baixo. É interessante olhar para o período da crise e tentar perceber porque é que alguns países foram atacados pelo mercado e outros não. Houve dois países, a Holanda e a Finlândia, que também tinham problemas nas suas economias, mas nunca foram atacados pelos mercados. Acho que a razão principal é que tinham níveis baixos de dívida. É um bom seguro.

Se houver uma crise, Portugal vai estar sob os holofotes?
 
O nível de dívida numa crise é apenas um elemento. Depende da balança corrente e hoje é completamente diferente do que foi, está mais ou menos equilibrada. Há alguns anos tinha um défice da balança corrente de cerca de 10% do PIB, todos os anos precisava de capital do resto do mundo equivalente a 10% do seu PIB. E se os investidores estrangeiros não quisessem emprestar, era um problema.
A balança corrente está a voltar ao negativo.
Talvez se torne negativa, mas é um número muito pequeno. Não tem de ser positiva, mas não deve tornar-se demasiado negativa como hás uns anos, porque foi um sinal de perda de competitividade numa escala muito elevada. Deve ser monitorizado, isso é claro. Pode ser um indicador antecipado de que alguma coisa está errada, mas neste momento não vejo isso.

O sistema financeiro português ainda é um problema para a Zona Euro?
 
Não, neste momento é sobretudo uma questão para a economia portuguesa. Todas as economias precisam de um sistema financeiro a funcionar bem, que seja capaz de providenciar empréstimos. E quando o malparado está assim tão alto, o funcionamento normal dos bancos para providenciar empréstimos está comprometido. E pode pressionar o crescimento da economia. Quando falamos de problemas por resolver, um deles é a taxa de crescimento potencial, que não é elevada, os ganhos de produtividade são baixos, o investimento desceu, o investimento direto estrangeiro não é assim tão elevado. São áreas que podem ser abordadas para tornar o país mais atraente.

O investimento público é demasiado baixo?
 
É obviamente mais produtivo gastar dinheiro em investimento em vez de no consumo. Mas estas são escolhas difíceis.

O Novo Banco foi o primeiro a ser resolvido com as regras de resolução únicas. Como avalia o resultado?
 
É parte das preocupações onde houve progressos, mas ainda não o suficiente.

Mas foi uma boa opção lidar com o problema desta forma?
 
Foi decidido com a Comissão Europeia. Não tenho razão para questionar a decisão.


A economia da UE abrandou, mas há instituições a dizer que vai melhorar. Qual é a sua perceção?
 
É também o que ouço quando falo com pessoas do mercado. Não é surpreendente que tenhamos tido alguma normalização. Já em 2018 as taxas de crescimento foram mais baixas do que em 2017, mas era inevitável. O crescimento foi quase o dobro do potencial em 2016 e 2017, tinha de haver uma normalização.
 
O que é a "normalização"?
 
Significa a zona euro ir ao encontro da tendência de longo prazo de crescimento potencial em torno de 1,5%. Há alguns fatores de risco em cima disso. As tensões comerciais são um deles, mas também o abrandamento da China, o Brexit também pode ter alguns efeitos negativos ao nível da confiança. Mas não há razão para esperar que isto continue a afundar e que acabe numa recessão.

Porquê?
 
Os fatores subjacentes na Europa continuam a ser bons. Muitos países, incluindo Portugal, continuam a criar emprego e os salários estão a subir. Há mais pessoas empregadas e que ganham um pouco mais e isso deve estabilizar o consumo e a procura doméstica. O investimento também deverá aumentar porque há constrangimentos de capacidade em muitos países. E a rendibilidade do setor empresarial como um todo é relativamente boa. As taxas de juro estão baixas. Pela primeira vez em dez anos a zona euro terá uma expansão orçamental moderada. É um ambiente em que é muito difícil ver uma recessão.

E se os riscos se materializarem? A zona euro tem ferramentas para reagir?
 
No plano orçamental, há ferramentas porque o défice orçamental da zona euro está abaixo de 1% do PIB. Por isso, ao contrário de outras grandes economias, como os Estados Unidos ou o Japão, há espaço orçamental.

Mas a dívida é muito elevada em alguns países.
 
É verdade. Mas olhando para a zona euro em conjunto, há espaço orçamental e o rácio da dívida no PIB está a cair já há quatro anos. Não é verdade em todos os países, mas no conjunto é. Nos EUA ou no Japão o défice é muito mais elevado e a dívida continua a crescer.

E na política monetária? Há margem para agir?
 
O BCE diz sempre que tem instrumentos disponíveis e acho que é verdade, não vejo razão para colocar em causa, embora já tenham usado muitos dos instrumentos. Os EUA obviamente têm mais espaço para baixar taxas de juro.

Os Estados-membros arranjaram o telhado a tempo?
 
Arranjámos a cave, o que é muito bom. Os países que tinham verdadeiros problemas macroeconómicos há dez ou oito anos – como perda de competitividade, défices elevados da conta corrente, níveis elevados de dívida e défices orçamentais elevados – todos fizeram o seu trabalho, particularmente aqueles países que atravessaram programas do FEEF e MEE.

Portugal é um bom exemplo?
 
Sim, claro. Dou sempre crédito aos países primeiro, se não tivessem resolvido os seus problemas – através de um ajustamento por vezes muito doloroso, estou consciente disso – ainda estaríamos numa crise. Em Portugal, na Grécia, mas também no Chipre, na Irlanda, os países ajustaram. Mas em cima de tudo isso, o BCE teve um papel importante, através de medidas não convencionais, e utilizámos os últimos oito anos para preencher buracos institucionais que havia no desenho da união monetária. Com a criação do ESM, estamos hoje em melhor forma.

A questão é se chega.
 
Estamos numa posição mais forte do que há dez anos, mas não é o fim da estrada.
 
Qual o ponto de situação das decisões da Cimeira do Euro?
 
Foi pedido ao MEE para providenciar o "backstop" para o Fundo Único de Resolução, estamos a desenvolvê-lo. Também estamos a rever os nossos instrumentos cautelares, que ainda não foram usados. O papel do MEE em crises futuras vai aumentar: com a Comissão Europeia, vai desenhar, negociar e monitorizar os programas de ajustamento. Há duas áreas em que o trabalho continua, mas não há acordo. Uma é o seguro europeu de depósitos. É importante tê-lo um dia, mas há um legado da crise, sobretudo crédito malparado, que precisa de ser resolvido primeiro.
 
Os bancos têm de escolher entre resolver o malparado depressa, assumindo custos, ou fazê-lo lentamente e atrasar o seguro europeu de depósitos.
 
Não é uma questão fácil, porque para resolvê-la é preciso capital. Mas enquanto não for resolvida, a rendibilidade dos bancos é baixa porque uma fatia grande dos seus empréstimos não responde. Não há rendimento, mas têm o custo.


Mas se resolverem depressa demais...
 
Há um plano para cada banco, acordado com o supervisor único europeu para os grandes bancos.
O progresso é visível em todos os países. Em Portugal o malparado desceu cerca de um terço nos últimos dois anos. É um bom progresso, mas precisa de continuar.

Até quando?
 
Em qualquer sistema bancário há algum malparado, não precisamos de ir para zero, mas alguma coisa como 3%, 4%, 5% dos empréstimos, não deveria ser muito mais.

Em todos os bancos?
 
Idealmente, sim. De outro modo não estão verdadeiramente capazes de fazer empréstimos e apoiar a economia. É uma pré-condição para voltar a um sistema bancário saudável. Esse é o objetivo.

E quanto tempo pode levar?
 
Depende dos bancos, da sua capacidade de gerar lucros, ou seja construir capital para se livrarem do malparado. Mas o progresso está a acontecer ano após ano. E todos os bancos sabem o que devem fazer.
Podemos ter de esperar dois ou três anos pelo seguro europeu de depósitos? Ou mais?
Pode ser ainda mais tempo.

Quanto tempo?
 
É muito difícil dizer porque não há acordo sobre o nível apropriado de malparado. Há também outros fatores quando falamos de reduzir o risco dos bancos. Alguns Estados-
-membros dizem que há bancos com um volume muito elevado de obrigações soberanas nacionais. Um dia vai haver um seguro europeu de depósitos. Não sei em que ano.

Concorda com a criação de um orçamento para a Zona Euro?
 
É o outro ponto controverso. A cimeira concordou em criar um instrumento orçamental para a competitividade e convergência.

Que quer dizer...?
 
Diz exatamente o que significa. Vai ser um instrumento orçamental da Zona Euro que suportará reformas para melhor a competitividade e a convergência de padrões de vida. Se for bem-sucedido, é positivo. Mas do que algumas pessoas, incluindo eu, sentem falta, é de uma capacidade orçamental para a estabilização macroeconómica. Vai demorar muito mais tempo.

A reforma está atrasada?
 
Estamos a trabalhar de forma dura no que foi decidido em dezembro. Quando há uma crise, há pressão para agir mais depressa, mas quando não há, reunir todas as vontades nacionais leva mais tempo. Podemos ter a sensação de que é lento, sinto isso também quando estou num debate, mas quando olho para os últimos cinco ou dez anos, vejo que muito foi alcançado. Devemos ser um pouco mais pacientes.

Qual o ponto de situação das novas funções do MEE?
 
Estamos a preparar as mudanças no tratado do MEE. É preciso uma decisão unânime dos 19 governos e depois tem de ser ratificado nos 19 parlamentos. Estamos a preparar o texto que, idealmente, estará pronto em junho para ser aprovado por cada Estado-membro nos meses seguintes. Isto é necessário para o "backstop", por exemplo. Algum do restante trabalho não precisa de uma mudança de tratado. Se houvesse uma crise, hipoteticamente falando, já poderíamos exercer o nosso papel reforçado. A ratificação vai demorar pelo menos um ano, a contar de junho.

Só depois disso podem começar a contratar pessoas?
 
Não. Podemos antecipar isso, porque temos um acordo. Mas não vamos contratar muitas pessoas, devemos crescer cerca de 20%, portanto 30 ou 40 pessoas.
 

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